A inflação voltou a ser um tema constante nas conversas dos brasileiros e com razão. Segundo dados recentes divulgados pelo IBGE, a taxa acumulada em 12 meses chegou a 5,48% em março de 2025, o maior patamar em mais de dois anos e bem acima da meta de 3% perseguida pelo Banco Central. Este cenário representa um desafio real para as famílias que veem seu poder de compra diminuir gradativamente, enquanto os preços de alimentos, energia e outros itens essenciais continuam subindo.
Não é por acaso que muitos brasileiros estão mudando seus hábitos de consumo. Uma pesquisa realizada pela Proteste mostrou que mais de 90% dos entrevistados já alteraram suas práticas de consumo nas principais áreas, como energia elétrica, alimentação e mobilidade. Cerca de 65% dos consumidores passaram a comprar marcas de preço mais baixo nos supermercados, e uma em cada três pessoas cortou os alimentos não essenciais da lista de compras.
Mas será que apenas cortar gastos é suficiente? Como podemos nos proteger de forma inteligente contra a erosão do poder aquisitivo causada pela inflação? Nas próximas linhas, você vai conhecer estratégias práticas e eficientes para lhe ajudar a navegar por esse cenário desafiador, protegendo seu orçamento e até mesmo aproveitando oportunidades que podem surgir em momentos de turbulência econômica.

O panorama inflacionário e como ele afeta seu bolso
Os dados mais recentes do IBGE revelam que, apesar de uma pequena desaceleração em março de 2025 (quando o IPCA registrou 0,56%, contra 1,31% em fevereiro), a inflação acumulada em 12 meses continua preocupante. Setores como alimentação seguem pressionando os preços – o tomate, por exemplo, teve alta de impressionantes 22,55% apenas em março, contribuindo significativamente para o índice geral. Este foi o sétimo aumento consecutivo do grupo de Alimentação e Bebidas, impactando diretamente o orçamento das famílias brasileiras.
O professor Flávio Espírito Santo, da Faculdade Santa Teresa, explica com clareza o fenômeno: “O termo inflação é usado para explicar a alta dos preços de um conjunto de produtos e serviços, resultando em um maior custo para o dia a dia. Com o mesmo salário que alguém ganhava ano passado e comprava determinados itens, hoje não consegue adquirir os mesmos produtos”.
Este é o efeito mais perverso da inflação – a perda silenciosa do poder de compra. Um simples exemplo ilustra bem essa realidade: se a inflação entre 2023 e 2024 foi de 10%, isso significa que o dinheiro perdeu 10% do seu poder aquisitivo. Na prática, quem gastava R$ 100 para comprar uma determinada cesta de produtos, agora precisa desembolsar R$ 110 para adquirir exatamente os mesmos itens.
A mudança no comportamento dos consumidores é um reflexo direto desse cenário. Segundo pesquisas recentes, os brasileiros estão:
- Negociando preços com mais frequência
- Solicitando descontos ativamente
- Avaliando com mais rigor as condições de pagamento
- Substituindo marcas tradicionais por alternativas mais acessíveis
- Comparando preços entre estabelecimentos diferentes (36% dos entrevistados)
- Adiando compras não essenciais (53% deixaram de comprar roupas)
- Reduzindo atividades sociais como idas a restaurantes (47%)
Francisco Luis Lima Filho, economista sênior do banco ABC Brasil, avalia que o quadro qualitativo da inflação continua se deteriorando, com previsão de que a inflação alcance 5,8% em dezembro de 2025. Entre os fatores que devem manter a pressão inflacionária estão o grupo de alimentos, o setor de serviços (pressionado por um mercado de trabalho aquecido) e industriais (refletindo a desvalorização do real).
Reorganizando seu orçamento: o primeiro passo para a proteção financeira
Diante desse cenário desafiador, o primeiro e mais importante passo é reorganizar completamente seu orçamento familiar. Celso Ribeiro Campos, professor da PUC-SP, recomenda a construção detalhada de uma planilha financeira, reunindo todas as despesas de forma minuciosa. “Uma despesa de supermercado precisa ser detalhada em todos os itens adquiridos. A despesa de cartão de crédito precisa também ser detalhada item por item”, explica o especialista.
Esta ferramenta é fundamental para compreender para onde está indo seu dinheiro e principalmente, para identificar oportunidades de economia. Rodrigo De Losso da Silveira Bueno, professor titular do departamento de economia da FEA-USP, complementa que uma planilha bem estruturada permite estabelecer metas mensais ou anuais, definir quanto e quando poupar, além de ajudar a encontrar formas de aumentar a receita familiar, mesmo em um contexto econômico adverso.
Os especialistas recomendam seguir um roteiro prático para essa reorganização:
- Exterminar dívidas: Antes de qualquer outra ação, foque em quitar dívidas, especialmente aquelas com juros altos. Quem está endividado deve resolver isso prioritariamente, evitando novos compromissos financeiros.
- Definir o que é essencial: Campos observa que a definição do que é gasto essencial varia conforme o perfil de cada família. É crucial priorizar o que ele chama de “consumo de subsistência”, ou seja, gastos que não podem ser reduzidos.
- Estabelecer conversas francas: Janser Rojo, planejador financeiro, recomenda que famílias conversem abertamente sobre o orçamento, sem segredos ou tabus. “É importante ter transparência e lutar juntos pelos objetivos.”
- Eleger um líder financeiro: Em geral, uma pessoa na família tem mais facilidade para lidar com números e organização. Esta pessoa pode assumir a liderança na gestão financeira, contando com o apoio e colaboração de todos.
- Definir objetivos claros: Estabeleça metas de curto, médio e longo prazo para sua família. Objetivos claros aumentam a motivação para manter a disciplina financeira.
Rodrigo Bueno destaca ainda que muitos produtos são consumidos por mero hábito, sem real necessidade. “É preciso identificar os desperdícios e evitá-los. Para isso, a família deve questionar o que aconteceria se deixasse de consumir determinado produto, avaliando se a resposta justifica continuar adquirindo-o.”
Estratégias práticas para economizar no dia a dia
Uma vez reorganizado o orçamento, é hora de implementar estratégias práticas para economizar no cotidiano. A boa notícia é que pequenas mudanças de hábitos podem resultar em economia significativa ao final do mês. Veja as principais áreas onde você pode atuar:
Alimentação e supermercado
A alta nos preços dos alimentos tem sido um dos principais vilões da inflação. A pesquisa da CNN Brasil Business mostra que 65% dos consumidores passaram a comprar marcas mais baratas ou próprias dos supermercados. Outras estratégias incluem:
- Comparar preços entre estabelecimentos diferentes (utilize aplicativos de comparação)
- Substituir proteínas mais caras por opções mais acessíveis
- Aproveitar promoções de final de dia para produtos frescos
- Elaborar um cardápio semanal baseado nos itens em promoção
- Evitar desperdícios, aproveitando integralmente os alimentos
Energia elétrica e utilidades
Cerca de 70% dos brasileiros relataram ter desligado aparelhos ou reduzido seu uso para economizar energia elétrica. Algumas medidas eficientes incluem:
- Substituir lâmpadas tradicionais por modelos LED (economia de até 80%)
- Desligar aparelhos da tomada quando não estiverem em uso
- Acumular roupas para utilizar a máquina de lavar com capacidade total
- Aproveitar a luz natural sempre que possível
- Negociar planos de internet, TV e telefonia (ou considerar pacotes mais simples)
Transporte e combustível
Com os preços dos combustíveis em alta, 45% dos entrevistados afirmaram estar deixando o carro na garagem. Outras alternativas incluem:
- Utilizar transporte público ou compartilhado quando viável
- Adotar técnicas de direção econômica (manutenção em dia, pressão correta dos pneus, evitar acelerações bruscas)
- Planejar rotas para otimizar deslocamentos
- Considerar biocombustíveis quando vantajosos
Categoria | Estratégias de Economia | Potencial de Economia Mensal |
Alimentação | Comparação de preços, marcas alternativas, evitar desperdícios | 15% a 30% |
Energia | Uso consciente, aparelhos eficientes, negociação de tarifas | 10% a 25% |
Transporte | Otimização de rotas, técnicas de economia, alternativas | 20% a 40% |
Serviços | Renegociação, pacotes adequados, avaliação de necessidade | 15% a 35% |
Conforme destacado pela pesquisa KPMG Consumer Pulse Survey, os consumidores estão mais propensos a negociar preços e solicitar descontos. Esta postura mais ativa pode gerar economias significativas, especialmente em serviços contratados recorrentemente. Vale a pena ligar para prestadores de serviço e solicitar descontos ou pacotes mais adequados ao seu perfil de consumo atual.
Protegendo seu patrimônio da corrosão inflacionária
Economizar é fundamental, mas proteger o patrimônio já acumulado da corrosão inflacionária é igualmente importante. Vinicius Góis, planejador financeiro CFP pela Planejar, destaca que “para se proteger e aproveitar a inflação, a melhor forma é investir em classes de ativos ligados ao próprio índice, que é o IPCA”.
Existem diversas alternativas de investimentos que podem ajudar a preservar o valor do seu dinheiro neste cenário:
- Títulos atrelados à inflação: O Tesouro IPCA+ oferece uma remuneração composta pela variação do IPCA mais uma taxa prefixada. Desta forma, seu investimento acompanha a inflação e ainda garante um ganho real.
- Debêntures incentivadas: Também podem ser atreladas ao IPCA, oferecendo proteção contra a inflação e ainda tendo a vantagem da isenção fiscal para pessoas físicas.
- Fundos imobiliários de recebíveis: Aqueles que possuem CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) atrelados ao IPCA ou ao CDI podem repassar a inflação para os rendimentos pagos aos cotistas.
- Diversificação com ativos dolarizados: Jeff Patzlaff, planejador financeiro, sugere que este é um bom momento para começar a aplicar recursos em ativos dolarizados ou fundos internacionais. “Moedas estrangeiras, como o dólar, tendem a se valorizar em cenários de inflação alta no Brasil”, argumenta.
Uma estratégia interessante para quem possui imóveis para locação é indexar os contratos de aluguel à inflação. “Isso ajuda a manter o poder de compra desses recebimentos, ajustando-os conforme a alta dos preços”, diz Patzlaff.
Para quem possui dívidas atreladas ao IPCA, como financiamentos imobiliários com essa indexação, a recomendação é avaliar a possibilidade de antecipar parcelas. Segundo especialistas, “caso tenha financiamentos indexados à inflação, antecipar parcelas pode reduzir custos e minimizar riscos”, especialmente em um cenário de aceleração inflacionária.
Navegando com inteligência pela tempestade
A inflação representa um desafio real para as famílias brasileiras, mas com planejamento adequado e estratégias bem executadas, é possível não apenas proteger seu orçamento, mas também criar oportunidades em meio à turbulência econômica.
Reorganizar o orçamento familiar, adotar hábitos de consumo mais conscientes, implementar estratégias práticas de economia no dia a dia e proteger o patrimônio com investimentos adequados são passos fundamentais nessa jornada. Lembre-se de que cada família tem suas próprias particularidades e necessidades, portanto, as estratégias devem ser personalizadas para sua realidade específica.
Como destaca o professor Flávio Espírito Santo, o melhor caminho para enfrentar a inflação em longo prazo é através da geração de empregos e incentivo à produção. “Com uma oferta maior, os preços tendem naturalmente a baixar”. Enquanto aguardamos por políticas mais efetivas nesse sentido, cabe a cada um de nós fazer a nossa parte, gerenciando com inteligência nossos recursos financeiros.
Em tempos de inflação alta, aqueles que se adaptam com rapidez e inteligência têm maiores chances de sobreviver à tempestade econômica e de se posicionarem de forma vantajosa para o cenário pós-tempestade. A resiliência financeira construída hoje será o diferencial para enfrentar os desafios econômicos de amanhã.
Fontes e referências:IBGE – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – Abril/2025
CNN Brasil Business – Dicas de como fazer o salário sobreviver até o fim do mês – Agosto/2021
Proteste – Pesquisa sobre mudanças nos hábitos de consumo – Julho/2022
KPMG Consumer Pulse Survey – Comportamento dos consumidores – Maio/2023
Faculdade Santa Teresa – Estudo sobre impactos da inflação – Maio/2023
B3 Bora Investir – Adaptação da rotina econômica aos juros e inflação – Março/2025
UOL Economia – 12 dicas para não estourar o orçamento do mês – Outubro/2015
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