O Brasil vive um momento significativo em sua política monetária. Com a taxa Selic atualmente em 14,25% ao ano, conforme decisão recente do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, estamos possivelmente nos aproximando do ápice deste ciclo de alta. Segundo projeções do mercado, a Selic deve alcançar o patamar máximo de 15% ainda em 2025, representando o maior nível desde maio de 2006. O próprio BC já sinalizou uma elevação de menor intensidade para a próxima reunião em maio, com o Citi, por exemplo, reduzindo sua projeção de alta de 0,75 para 0,50 ponto percentual. Este cenário de possível estabilização e eventual início de queda da taxa básica de juros exige dos investidores uma preparação cuidadosa e estratégica. Neste artigo, vamos explorar como rebalancear sua carteira para este novo cenário, identificar quais classes de ativos podem se beneficiar destas mudanças e quais riscos devem ser monitorados durante esta importante transição no mercado financeiro brasileiro.

Estratégias para rebalancear a carteira considerando a possível mudança na política monetária
Um cenário de estabilização ou início de queda da taxa Selic após um longo período de alta representa um ponto de inflexão importante para os investidores. O rebalanceamento de carteira neste momento não deve ser reativo, mas sim estratégico e baseado em uma análise cuidadosa das perspectivas econômicas.
A primeira consideração fundamental é o timing. Embora o Banco Central já sinalize uma diminuição no ritmo de altas, com uma elevação menor prevista para maio de 2025, isso não significa necessariamente o fim imediato do ciclo. Segundo a ata da última reunião do Copom, “o ciclo não está encerrado”, e o fim das altas dependerá das projeções de inflação do BC, como apontou Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco.
Para investidores com perfil mais conservador, este é um momento interessante para assegurar taxas atraentes em títulos pré-fixados de médio e longo prazo, aproveitando o atual patamar elevado da Selic. Conforme destacado pelo professor Marcos Milan, da FIA Business School, “para médio/longo prazo, o investidor deve ficar atento às oportunidades em ativos pré-fixados. Isso porque, ao investir em um ativo com rentabilidade já estabelecida, ele se protege do viés de queda da taxa básica de juros”.
Investidores com maior tolerância a risco podem começar a aumentar gradativamente sua exposição a ativos variáveis, mas de forma cautelosa. Como observou Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research: “Para o investidor que não tem exposição a ativos de risco, seria interessante aumentar gradualmente o peso neles”, embora ressalte que “a alocação deve estar dentro do perfil de risco do investidor”.
Uma estratégia equilibrada seria manter uma parte substancial em renda fixa, aproveitando os juros ainda elevados, enquanto começa a posicionar-se estrategicamente em ativos que tendem a se valorizar com a eventual queda da Selic. Esta abordagem é corroborada por analistas da Nord Investimentos, que recomendam “uma carteira balanceada, com um bom montante em renda fixa, mas também com um pé nas ações que devem se beneficiar de uma mudança no cenário”.
Classes de ativos que tendem a se beneficiar da estabilização ou queda dos juros
O comportamento das diferentes classes de ativos tende a variar significativamente com a mudança no ciclo de juros. Entender como cada uma pode reagir é fundamental para posicionar-se adequadamente.
No mercado acionário, historicamente, o desempenho das ações é negativo nos meses seguintes ao fim da alta de juros, como apontam estrategistas do mercado. No entanto, este é um momento em que setores específicos podem apresentar oportunidades. Segundo Clayton Calixto, especialista de portfólio da Santander Asset, “bancos e empresas relacionadas ao minério de ferro são as bolas da vez”. Ele explica que nas mineradoras e siderúrgicas, “a exportação é a grande vantagem, já que essas companhias têm parte da receita em dólar, o que ajuda a proteger o patrimônio contra a variação positiva da moeda americana”.
Anderson Silva, head de renda variável e sócio da GT Capital, também destaca “o setor de energia elétrica como um porto seguro por causa da forte geração de caixa das empresas”. Além disso, empresas de crescimento e cíclicas, incluindo construtoras, tendem a se beneficiar de juros mais baixos. Em ciclos anteriores de queda dos juros, ações de varejo e construção civil chegaram a apresentar valorizações expressivas.
No campo dos fundos imobiliários, a eventual queda da Selic tende a aumentar sua atratividade. À medida que os investimentos atrelados à Selic ou ao CDI passam a render menos, os FIIs ganham destaque por oferecerem rendimentos mensais e potencial de valorização. No entanto, é importante selecionar fundos com boa gestão e ativos de qualidade.
Na renda fixa, o cenário de fim de ciclo de alta sugere oportunidades em títulos prefixados e indexados à inflação, especialmente para prazos mais longos. André Alirio, analista da Nova Futura, aponta que “títulos bancários (CDBs, LCI e LCA) tendem a ter taxas interessantes”. Ele ressalta que “quanto mais longo um CDB, LCI, ou LCA em IPCA+ mais interessante e atrativo ele pode ser”.
Ruy Hungria, analista da Empiricus Research, sugere que os investidores acostumados com os ganhos de dois dígitos da renda fixa nos últimos anos precisarão buscar outras alternativas para continuar recebendo bons retornos, e aponta as ações pagadoras de dividendos como uma “porta de entrada” para a renda variável.
Tabela: Comportamento Esperado das Classes de Ativos no Fim do Ciclo de Alta da Selic
Classe de Ativo | Impacto Esperado | Horizonte Recomendado | Nível de Risco |
Títulos Pré-fixados | Positivo a médio/longo prazo | 2+ anos | Baixo a médio |
Títulos Indexados à Inflação | Neutro a positivo | 3+ anos | Médio |
Títulos Pós-fixados | Rendimento decrescente | 1-2 anos | Baixo |
Ações de Bancos | Potencialmente positivo | 3+ anos | Alto |
Ações de Consumo | Positivo com a recuperação econômica | 3+ anos | Alto |
Ações de Crescimento | Altamente positivo com queda dos juros | 5+ anos | Muito alto |
Fundos Imobiliários de Tijolo | Positivo a médio prazo | 3+ anos | Médio |
Fundos Imobiliários de Papel | Impacto variável | 2+ anos | Médio a alto |
Riscos a serem monitorados nessa transição
Apesar das oportunidades que surgem com o possível fim do ciclo de alta da Selic, existem riscos significativos que os investidores devem monitorar atentamente nessa transição.
O primeiro deles é o comportamento da inflação. O fim do ciclo de alta dos juros dependerá fundamentalmente das projeções de inflação do Banco Central. Conforme destacado por Mario Mesquita, do Itaú Unibanco, “o BC não deve fazer um movimento de política monetária divorciado das projeções”. Para que o BC encerre o ciclo de alta, “ele tem que ter uma projeção que permita”, e “certamente uma projeção acima de 3,5% já está distante da meta”.
O cenário fiscal brasileiro também é um fator de risco relevante. O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, alertou que a mudança de perspectiva sobre a política monetária “aumenta o cenário de risco” sobre a economia brasileira. No primeiro semestre de 2024, o governo apresentou um déficit de R$ 68,7 bilhões nas contas públicas, uma piora em relação ao mesmo período de 2023. Este desequilíbrio fiscal pode pressionar a inflação e limitar o espaço para quedas mais acentuadas da Selic no futuro.
Outro risco importante vem do cenário externo, especialmente da política monetária dos Estados Unidos. A perspectiva de início de cortes da taxa de juros nos EUA a partir de setembro pode trazer uma “melhora para mercados emergentes”, como o Brasil, segundo Ceron. No entanto, qualquer mudança nessa expectativa pode causar volatilidade nos mercados globais e impactar negativamente os ativos brasileiros.
Para os investimentos específicos, há riscos distintos a serem considerados. No mercado acionário, por exemplo, existe o risco de que a economia real não responda tão positivamente à mudança no ciclo de juros quanto o mercado antecipa. Nas palavras de Clayton Calixto, as ações “não são cavalo de aposta para o investidor, porque os juros seguem atrativos”.
Na renda fixa, especialmente em títulos prefixados de longo prazo, existe o risco de marcação a mercado caso os juros voltem a subir inesperadamente. Por isso, o professor Marcos Milan alerta para que os investidores não entrem em “histeria ou efeito manada” em relação ao ciclo de baixa e a renda fixa. “Quando o investidor movimenta seu dinheiro a partir de uma única informação (queda da Selic), ele corre o risco de ter sua carteira desalinhada de sua estratégia, além de perder eficiência tributária”.
A economia brasileira está atravessando um momento crítico, com a taxa Selic possivelmente se aproximando do fim de seu ciclo de alta. Esta transição traz tanto oportunidades quanto desafios para os investidores.
O rebalanceamento estratégico da carteira deve considerar tanto o cenário atual quanto as perspectivas futuras. Manter uma base sólida em renda fixa, aproveitando os juros ainda elevados, enquanto se posiciona gradualmente em ativos que podem se beneficiar da estabilização ou queda dos juros, parece ser a abordagem mais prudente.
Entre as classes de ativos com potencial de destaque nesse novo cenário estão setores específicos da bolsa, como bancos, mineradoras e energia elétrica, além de ações pagadoras de dividendos. Na renda fixa, títulos prefixados de médio e longo prazo e ativos indexados à inflação podem oferecer boas oportunidades.
No entanto, é fundamental monitorar atentamente os riscos, especialmente o comportamento da inflação, o cenário fiscal brasileiro e a política monetária global. O sucesso dos investimentos nesse período de transição dependerá não apenas das escolhas de alocação, mas também da disciplina para seguir a estratégia definida, ajustando-a conforme necessário com base nas novas informações e desenvolvimentos do mercado.
Como em qualquer jornada de investimentos, o mais importante é manter o foco nos objetivos de longo prazo, evitando reações impulsivas às flutuações de curto prazo, e buscar uma estratégia personalizada que reflita seu perfil de risco e horizonte de investimento.
Fontes e referências:
Tabela Selic Maio/2025 – Sefaz CE, publicado em maio de 2025
Focus: projeção de Selic no fim de 2025 segue em 15,0% – Broadcast Notícias, março de 2025
Fim da alta da Selic dependerá das projeções de inflação do BC – Bloomberg, março de 2025
Decisão de juros no Brasil: o que esperar da Selic? – Nord Investimentos, maio de 2025
Fim das altas da Selic está próximo – Money Times, abril de 2025
Citi reduz projeção de alta da Selic em maio – InfoMoney, abril de 2025
DISCLAIMER: As informações contidas neste artigo são de caráter informativo e educacional, elaboradas por profissional certificado como Assessor de Investimentos pela ANCORD, em conformidade com as normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
O conteúdo apresentado reflete análises e opiniões fundamentadas em dados públicos e estudos de mercado, não constituindo oferta, solicitação, sugestão ou recomendação específica de investimento.
Cada investidor deve realizar sua própria análise de risco e consultar seu assessor de investimentos para avaliação personalizada antes de tomar qualquer decisão.
Investimentos envolvem riscos e podem resultar em perdas patrimoniais. Rentabilidade passada não é garantia de resultados futuros. Os investidores devem estar cientes de que qualquer tipo de investimento contém riscos e não há garantia de retorno ou proteção contra perdas.
Este material não substitui o relacionamento cliente-assessor e as recomendações personalizadas que devem ser feitas considerando o perfil de risco, objetivos e situação financeira individual de cada investidor.
Para informações específicas sobre produtos de investimento, consulte seu assessor de investimentos ou a instituição financeira de sua preferência.