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Inflação à mesa: como o Google se tornou um termômetro do aumento de preços no Brasil

A alta nos preços dos alimentos tem preocupado cada vez mais os brasileiros, um fenômeno que se reflete claramente no mundo digital. Um levantamento recente do Google Trends, divulgado com exclusividade à CNN, revela que a procura por explicações sobre o aumento no preço de produtos como ovo e café disparou nos últimos dias, com crescimento superior a 5.000% no volume de buscas. Essa explosão de interesse não é apenas um dado curioso, mas um importante termômetro socioeconômico que reflete a crescente pressão no orçamento das famílias brasileiras.

Segundo o IPCA de março de 2025, divulgado pelo IBGE, a inflação no grupo de Alimentação e bebidas acelerou para 1,17%, respondendo por cerca de 45% do índice geral do mês. Alguns itens chamam particular atenção: o café moído acumula uma alta de 77,78% nos últimos 12 meses, enquanto o ovo de galinha subiu 31,70% no acumulado do ano. O tomate, outro vilão da cesta básica, teve um aumento de 22,55% apenas em março.

Este artigo explora como as buscas no Google têm se tornado um importante indicador econômico, revelando as preocupações dos brasileiros, sinalizando tendências de consumo e mudanças comportamentais frente à inflação dos alimentos. Analisarei os alimentos que mais pressionam o orçamento familiar, as reações dos consumidores e as perspectivas para os próximos meses.

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O Google como termômetro econômico: o que as buscas revelam sobre nossa preocupação

As ferramentas digitais têm se mostrado cada vez mais relevantes para entender o comportamento e as preocupações da sociedade. O Google Trends, que analisa o volume de buscas realizadas na internet, tornou-se um verdadeiro termômetro econômico, revelando em tempo real as inquietações dos consumidores brasileiros frente à inflação.

Dados da Sala Digital, parceria da Band com o Google, mostram que o interesse por expressões como “está caro” ou “está barato” subiu 20% em relação a 2024 e alcançou nível histórico em 2025. O índice, que há 21 anos era de apenas 9 pontos, saltou para 100 pontos neste ano, demonstrando um interesse sem precedentes dos consumidores pelo preço dos produtos.

Um fato sintomático ocorreu no início de fevereiro de 2025: pela primeira vez em cinco anos, a busca por “café caro” superou a de “carro mais barato”, evidenciando como os alimentos básicos passaram a ter maior relevância nas preocupações financeiras da população. Este movimento virtual reflete diretamente a realidade econômica do país, onde a inflação de alimentos tem pressionado significativamente o orçamento familiar.

O levantamento do Google Trends também explica que as pesquisas não se limitam a itens de consumo diário. Alimentos que tradicionalmente já possuem um valor mais elevado, como pistache, kiwi e caviar, também aparecem entre as principais pesquisas. Isso sugere uma preocupação generalizada com o custo de vida, que transcende as classes sociais e afeta diferentes perfis de consumidores.

É interessante notar que este comportamento de busca não é um fenômeno isolado. Em 2020, durante a pandemia, o Brasil já havia registrado um recorde nas buscas pelo termo “preço”, com as procuras pelo preço do arroz atingindo 100 pontos em setembro daquele ano. Na época, as pesquisas sobre os preços do arroz aumentaram 960% em relação ao ano anterior.

A correlação entre os picos de busca no Google e os períodos de alta inflação é notável. Analisando os dados desde 2004, observa-se que os aumentos nas pesquisas por termos relacionados a preços coincidem sistematicamente com momentos de aceleração inflacionária no país, confirmando o valor do Google Trends como uma ferramenta complementar de análise econômica.

Café, ovos e outros vilões: os produtos que mais pesam no bolso do brasileiro

A inflação dos alimentos tem apresentado um comportamento particularmente preocupante nos últimos meses, com alguns itens se destacando como verdadeiros “vilões” da cesta básica. De acordo com os dados do IPCA de março de 2025, divulgados pelo IBGE, o grupo Alimentação e bebidas acelerou de 0,70% em fevereiro para 1,17% em março, exercendo forte pressão sobre o índice geral.

Para entender melhor este cenário, vamos analisar os alimentos que registraram as maiores altas recentemente:

AlimentoVariação em março 2025Acumulado no anoAcumulado 12 meses
Café moído8,14%30,04%77,78%
Ovo de galinha13,13%31,70%19,52%
Tomate22,55%52,90%0,13%
Leite longa vida3,34%0,71%11,89%
Manga25,64%40,89%-9,66%
Pão francês1,18%2,76%5,23%

O café moído merece destaque especial, acumulando uma impressionante alta de 77,78% nos últimos 12 meses. Segundo o IBGE, este aumento foi “impulsionado pelo aumento do preço no mercado internacional dada a redução de oferta do grão em escala mundial, com a quebra de safra no Vietnã devido a adversidades climáticas, as quais também prejudicaram a produção interna”.

Já o ovo de galinha, com alta de 13,13% apenas em março e 31,70% no acumulado do ano, teve seu aumento atribuído a múltiplos fatores. Fernando Gonçalves, gerente da pesquisa do IBGE, explica que “houve aumento por conta do custo do milho, base da ração das aves, além de estarmos no período de quaresma, com maior demanda por essa proteína”. Este cenário não é exclusivo do Brasil: nos Estados Unidos, a situação é ainda mais dramática, com a gripe aviária dizimando milhões de galinhas poedeiras e provocando um aumento de 55% nos preços em relação ao ano anterior, conforme reportado pela InfoMoney em fevereiro de 2025.

O tomate, por sua vez, registrou uma expressiva alta de 22,55% em março, contribuindo significativamente para a inflação dos alimentos. De acordo com o IBGE, “com o calor dos meses de verão, houve uma aceleração na maturação, levando a antecipação da colheita em algumas praças. Sem essas áreas de colheita em março, houve uma redução na oferta, trazendo pressão de alta sobre os preços”.

É importante observar que estes aumentos não afetam apenas as compras domésticas, mas também o setor de alimentação fora do lar, que registrou alta de 0,77% em março, com destaque para refeições (0,86%) e cafezinho (3,48%). Este efeito em cadeia acaba pressionando ainda mais o custo de vida dos brasileiros.

Historicamente, o fenômeno não é novo. Em dezembro de 2019, a InfoMoney já reportava que o tradicional prato feito do brasileiro – arroz, feijão, bife, batata e ovo – estava pesando mais no bolso do consumidor, com a alta de preços de quase todos alimentos básicos acumulada nos 12 meses até novembro daquele ano superando a inflação geral do país, de 3,27% para o período.

Da pesquisa à ação: como os brasileiros têm reagido à alta dos alimentos

O aumento nas buscas por preços de alimentos no Google não é apenas um indicador passivo da preocupação dos brasileiros, mas também reflete uma mudança ativa no comportamento de consumo. À medida que os preços sobem, os consumidores estão cada vez mais informados e estratégicos em suas decisões de compra.

Um fenômeno interessante observado é a correlação entre as buscas online e as decisões práticas de consumo. Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sugeriu que os consumidores “evitem comprar produtos com preços elevados como forma de pressionar o mercado”, conforme noticiado pela InfoMoney em janeiro de 2025, as buscas por alternativas mais baratas para alimentos básicos aumentaram significativamente nas semanas seguintes.

Os consumidores brasileiros têm adotado diversas estratégias para enfrentar a inflação alimentar. A substituição de produtos se tornou comum, com a troca de carne bovina por ovos, frango ou proteína vegetal. No entanto, com a alta recente no preço dos ovos, essa estratégia tem se mostrado cada vez menos eficaz. A pesquisa de preços também se intensificou, com os brasileiros visitando mais estabelecimentos antes de realizar suas compras e dedicando mais tempo à comparação de valores.

Outras mudanças comportamentais incluem a redução do desperdício, com maior aproveitamento e técnicas de conservação para prolongar a vida útil dos alimentos; alterações nos hábitos alimentares, com inclusão de alimentos sazonais e locais; e busca mais intensa por promoções e descontos, refletida no aumento de pesquisas por termos como “promoção de supermercado” e “descontos em alimentos”.

Um aspecto positivo em meio a este cenário desafiador é o crescimento de iniciativas solidárias. O programa Sesc Mesa Brasil do Distrito Federal, por exemplo, bateu recorde de arrecadação de alimentos em julho de 2024, com mais de 256.000 kg de produtos recolhidos, beneficiando cerca de 100 mil pessoas, conforme reportado pelo Observatório Sesc DF. Este tipo de iniciativa tem se mostrado fundamental para auxiliar famílias em situação de vulnerabilidade alimentar.

No setor produtivo, a resposta tem sido igualmente significativa. O Brasil consolidou-se como o maior exportador de alimentos industrializados para o resto do planeta, abastecendo 190 países e gerando mais de 150 mil novos postos de trabalho diretos ou indiretos apenas no primeiro semestre de 2024, de acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA). Este desempenho no mercado externo, embora positivo para a balança comercial, também exerce pressão sobre os preços internos, já que parte da produção é destinada à exportação.

Perspectivas para o bolso: o que esperar para os preços dos alimentos em 2025

O cenário para os preços dos alimentos nos próximos meses apresenta sinais contraditórios, com fatores que podem tanto aliviar quanto pressionar ainda mais a inflação alimentar. A compreensão destas tendências é fundamental tanto para o planejamento familiar quanto para decisões de investimento.

Um dos principais fatores que podem contribuir para a redução dos preços é a expectativa de uma safra recorde para 2025. Segundo o ministro da Casa Civil, Rui Costa, “este ano, a expectativa é de uma supersafra. O clima está ajudando e, ao longo deste primeiro semestre, teremos a colheita. Todos os dados indicam que teremos uma supersafra, o que resultará na queda do preço dos alimentos”. Esta perspectiva positiva é corroborada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, que afirmou que “a safra agrícola recorde e a redução do dólar frente ao real são fatores que ajudarão a reduzir o preço dos alimentos neste ano”.

A tendência de queda do dólar, que chegou a R$ 5,73 em abril de 2025 segundo o Valor Econômico, também pode contribuir para aliviar os preços dos alimentos, especialmente daqueles que dependem de insumos importados ou que têm seus preços influenciados pelo mercado internacional, como é o caso do café e da soja. Como explicou Alckmin: “Você tem fertilizante, combustível, equipamento, muita coisa que é contaminada pelo dólar. Então, com a redução do dólar, também vai ajudar”.

Por outro lado, alguns fatores estruturais continuam pressionando os preços. As mudanças climáticas, com variações extremas como secas e inundações, têm afetado a produção agrícola global. Como observado pelo IBGE no caso do tomate e do café, as adversidades climáticas podem reduzir a oferta e pressionar os preços mesmo em cenários de boa safra. Além disso, com o Brasil consolidando-se como um importante exportador de alimentos, a forte demanda internacional pode continuar pressionando os preços internos.

O governo federal tem estudado medidas para conter a alta dos preços dos alimentos. Entre as possibilidades está a redução da alíquota de importação para produtos que estiverem mais caros no mercado interno em relação ao mercado internacional. “Todos os produtos que tiverem preço interno maior do que o externo, vamos atuar imediatamente na alíquota de importação”, afirmou o ministro Rui Costa em janeiro de 2025.

Outra medida importante é a desoneração da cesta básica aprovada na reforma tributária, que deve entrar em vigor gradualmente e poderá aliviar a pressão sobre os preços dos alimentos essenciais para as famílias brasileiras.

Para os investidores, este cenário sugere oportunidades em empresas do setor agrícola com boa projeção de safra e exportações, mas também demanda atenção aos riscos associados a fatores climáticos e políticas governamentais que possam afetar o mercado. Já para os consumidores, a recomendação é manter-se informado sobre tendências de preços e sazonalidade dos alimentos, utilizando ferramentas como o Google Trends para entender o comportamento do mercado e identificar alternativas mais econômicas em momentos de alta.

Além das buscas digitais, um reflexo da economia real

A disparada nas buscas por preços de alimentos no Google reflete uma realidade econômica desafiadora para os brasileiros, mas também revela um consumidor mais consciente e ativo na gestão de seu orçamento. O Google Trends, ao capturar em tempo real estas preocupações, tornou-se um valioso termômetro socioeconômico, complementando os indicadores oficiais de inflação.

A escalada nos preços de alimentos básicos como café, ovos e tomate tem pressionado significativamente o orçamento familiar, levando os consumidores a adaptarem seus hábitos de consumo e a buscarem alternativas mais econômicas. Este comportamento, embora motivado por dificuldades financeiras, pode contribuir para a formação de consumidores mais informados e conscientes no longo prazo.

As perspectivas para os próximos meses trazem sinais mistos: por um lado, a expectativa de uma safra recorde e a tendência de queda do dólar podem aliviar a pressão inflacionária; por outro, fatores estruturais como mudanças climáticas e custos de produção ainda representam desafios. As medidas governamentais em estudo, como a redução de alíquotas de importação e a desoneração da cesta básica, também serão determinantes para a trajetória dos preços.

Para além das questões econômicas imediatas, este cenário nos convida a uma reflexão mais ampla sobre segurança alimentar, modelos de produção sustentável e políticas públicas de longo prazo. A alimentação, afinal, não é apenas uma questão de mercado, mas um direito fundamental que precisa ser garantido a todos os brasileiros.

Fontes e referências:

CNN/Google Trends: Buscas por alta dos alimentos crescem 5.000% (28/03/2025)
Observatório Sesc DF: Recorde de arrecadação de alimentos em julho (22/07/2024)
InfoMoney: Prato feito pesa mais no bolso do brasileiro (09/12/2019)
IBGE: Apresentação IPCA – Março 2025 (11/04/2025)
Band: Inflação faz consumidor recorrer ao Google (12/03/2025)

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Luiz Eduardo Correa Pinto

Assessor de Investimentos Associado na BLUE3 | XP Investimentos, com mais de duas décadas de experiência em liderança comercial e especialização no setor financeiro. Expertise consolidada em soluções de investimentos, planejamento patrimonial e sucessório para pessoas físicas e jurídicas. Sólida trajetória na Indústria de Pagamentos, incluindo POS, API, câmbio e soluções SAAS. Experiência multicultural em negociações complexas e gestão de relacionamentos estratégicos.

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