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Guerra comercial EUA-China: como o Brasil pode navegar entre os gigantes

A guerra comercial entre Estados Unidos e China atingiu novos patamares em 2025, criando ondas de impacto que se espalham por toda a economia global. Para o Brasil, esta disputa entre as duas maiores potências econômicas do mundo representa tanto desafios quanto oportunidades. Com tarifas que chegaram a níveis sem precedentes – 145% impostas pelos EUA sobre produtos chineses e 125% pela China sobre produtos americanos – estamos testemunhando uma transformação nas relações comerciais globais que pode remodelar o cenário econômico por anos.

Neste artigo, analisaremos como essa escalada tarifária afeta diferentes setores da economia brasileira, quais estados podem ganhar ou perder com a disputa e como investidores podem se posicionar estrategicamente diante deste cenário de incertezas. Também examinaremos as recentes declarações de autoridades americanas que sinalizam uma possível descompressão nas tensões e o que isso significaria para as oportunidades de “desvio de comércio” que se abrem para o Brasil.

Enquanto as duas maiores economias do mundo disputam espaço e poder no tabuleiro global, o Brasil pode encontrar brechas significativas para expandir sua participação no comércio internacional – mas isso exigirá uma combinação de estratégia governamental, agilidade empresarial e investimentos inteligentes.

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A escalada das tensões e o possível recuo

A disputa comercial atual teve início em abril de 2025, quando o presidente americano Donald Trump anunciou um aumento tarifário que rapidamente escalou para níveis extraordinários. Em poucos dias, as tarifas americanas sobre produtos chineses saltaram de 34% para 104% e finalmente para 145%, enquanto a China revidou elevando suas tarifas para 125% sobre produtos americanos.

Esta intensificação nas tensões abalou os mercados globais e trouxe preocupações sobre uma possível recessão nos EUA, criando um clima de incerteza que afetou decisões de investimento em todo o mundo. No entanto, declarações recentes do secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, sugerem uma possível abertura para a descompressão do conflito.

“Estou confiante de que os chineses desejarão chegar a um acordo. E, como eu disse, este será um processo de várias etapas. Primeiro, precisamos reduzir a tensão e, com o tempo, começaremos a nos concentrar em um acordo comercial mais amplo”, afirmou Bessent em entrevista à Fox Business Network no início de maio.

Em outra ocasião, Bessent foi ainda mais direto: “Nenhum dos lados acredita que esses níveis sejam sustentáveis. Como eu disse ontem, isso é o equivalente a um embargo e uma ruptura entre os dois países no comércio não é do interesse de ninguém”.

Estas sinalizações ganharam força com reportagens indicando que a Casa Branca poderia considerar reduzir as tarifas para até 50%. Mesmo que este percentual ainda represente um nível elevado de protecionismo, seria um recuo significativo em relação aos atuais 145%.

Os impactos já são visíveis nas cadeias de suprimentos globais. A transportadora alemã Hapag-Lloyd reportou que 30% dos embarques da China para os EUA foram cancelados, enquanto estudos econômicos estimam que o impacto global da guerra tarifária representa uma queda de 0,25% no PIB mundial, equivalente a uma perda de US$ 205 bilhões.

Para a China, a situação é particularmente desafiadora, pois o país já enfrentava uma desaceleração econômica antes mesmo da escalada tarifária. Analistas sugerem que, se as tarifas forem mantidas, a China poderá ser pressionada a implementar um pacote de estímulos econômicos semelhante ao de 2008, quando o governo chinês injetou 4 trilhões de yuans (US$ 586 bilhões na época) para combater os efeitos da crise financeira global.

Impactos assimétricos no Brasil: quem ganha e quem perde

Para o Brasil, os efeitos da guerra comercial não são uniformes – alguns setores e regiões devem se beneficiar, enquanto outros enfrentarão desafios adicionais. Um estudo publicado por economistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) revela essas assimetrias com clareza.

Segundo a pesquisa, estados do Centro-Oeste, Paraná e Rio Grande do Sul terão ganhos com a disputa, enquanto estados do Sudeste enfrentarão as maiores perdas. Em São Paulo, o impacto corresponde a uma perda estimada de cerca de R$ 4 bilhões (0,14% do PIB paulista), e em Minas Gerais, de R$ 1,16 bilhão (0,15% da economia mineira).

Em contrapartida, os ganhos projetados para o Centro-Oeste são estimados em quase R$ 7 bilhões, praticamente equivalendo às perdas nos estados do Sudeste. O Mato Grosso seria o grande beneficiário, com um ganho projetado de R$ 5,3 bilhões.

Esta distribuição desigual de impactos pode ser explicada pela estrutura produtiva de cada região. Estados com forte presença do agronegócio, especialmente na produção de soja e outros grãos, tendem a se beneficiar do redirecionamento da demanda chinesa, que busca alternativas aos produtos americanos. Já estados com perfil mais industrial podem sofrer com o aumento da concorrência de produtos chineses que, barrados no mercado americano, buscam novos destinos, incluindo o Brasil.

Região/EstadoImpacto Estimado% do PIB Local
Centro-Oeste+R$ 7 bilhõesPositivo
Mato Grosso+R$ 5,3 bilhõesPositivo
São Paulo-R$ 4 bilhões-0,14%
Minas Gerais-R$ 1,16 bilhão-0,15%

No setor de calçados, por exemplo, já se observa uma ampliação das vendas para os EUA, com importadores americanos buscando fornecedores brasileiros para substituir os chineses. Empresários brasileiros relatam aumento nas consultas após o “tarifaço”, embora nem todas se convertam em negócios fechados devido às incertezas econômicas.

No agronegócio, a China tem aumentado a compra de soja brasileira como alternativa à americana, e há boas perspectivas para exportações de carne de frango e sorgo. Este movimento não é inédito – durante o primeiro mandato de Trump, o Brasil também se beneficiou de um redirecionamento semelhante nas compras chinesas.

Para o setor industrial, no entanto, há preocupações. Como apontou o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral: “No caso do aço, os produtores brasileiros não estavam preocupados com a tarifa de 25%, mas com o fato de que os produtores de aço chineses talvez quisessem trazer para o Brasil o produto excedente”. Este risco de “dumping” chinês pode afetar negativamente diversos segmentos industriais brasileiros.

Apesar desses movimentos setoriais significativos, o impacto global no PIB brasileiro seria de apenas 0,01%, segundo as estimativas – um número que mascara as grandes diferenças regionais e setoriais.

Navegando entre gigantes: estratégias para o Brasil

A guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo cria um cenário de “desvio de comércio” que pode beneficiar países como o Brasil, desde que haja agilidade e estratégia para aproveitar as oportunidades que surgem.

O professor Marcus Vinicius de Freitas, da Universidade de Relações Exteriores da China, destaca que este pode ser um momento oportuno para o Brasil fortalecer suas relações comerciais com a China: “Seria o momento de o pessoal no Ministério de Desenvolvimento e de Comércio Exterior no Brasil já estar preparando as malas para vir para a China para oferecer uma quantidade de produtos que nós poderíamos facilmente substituir os Estados Unidos”.

Esta visão é compartilhada pelo deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que acredita que o Brasil precisa agir com pragmatismo: “O Brasil tem, nessa disputa, uma grande oportunidade, mas precisa ter pragmatismo, buscar fixar parcerias duradouras e não se envolver na [disputa] retórica. Ou seja, contratos de longo prazo e associações com empresas dos países destinatários de nossas exportações”.

Para investidores, este cenário sugere algumas estratégias potencialmente promissoras:

  1. Foco em commodities agrícolas: Empresas brasileiras exportadoras de soja, carne de frango e sorgo podem se beneficiar do aumento da demanda chinesa. Investimentos em empresas do agronegócio com forte presença exportadora podem representar oportunidades.
  2. Atenção a empresas de logística: O redirecionamento do comércio global exigirá ajustes nas cadeias logísticas, potencialmente beneficiando empresas brasileiras de transporte e infraestrutura.
  3. Cuidado com setores industriais vulneráveis: Segmentos como aço, têxteis e eletrônicos podem enfrentar maior concorrência de produtos chineses desviados para o mercado brasileiro.
  4. Diversificação geográfica: Empresas com presença em estados do Centro-Oeste podem se beneficiar mais diretamente da atual conjuntura.

No entanto, há desafios a considerar. Como alertou o economista Pedro Faria, da UFMG, a instabilidade gerada pela guerra comercial tende a provocar fuga de capitais de países emergentes como o Brasil. Além disso, a “bagunça em toda a logística do comércio internacional” pode aumentar custos de transporte e seguros, afetando a competitividade brasileira.

O próprio Itamaraty mantém uma posição cautelosa, avaliando que “uma guerra comercial não é boa para ninguém”, o que sugere que o Brasil deve buscar uma posição equilibrada, evitando um alinhamento excessivo com qualquer um dos lados da disputa.

O que esperar: cenários e possibilidades

A guerra comercial entre EUA e China entrou em uma fase de elevada incerteza, com sinalizações contraditórias sobre a possibilidade de descompressão. As declarações do secretário do Tesouro americano sugerem abertura para o diálogo, mas colocam o ônus do primeiro passo sobre a China: “Acredito que cabe à China diminuir a escalada, porque eles nos vendem cinco vezes mais do que nós vendemos para eles, e essas tarifas de 120%, 145% são insustentáveis”.

Para investidores brasileiros, o cenário demanda atenção constante aos desdobramentos desta disputa. A manutenção das altas tarifas por um período prolongado pode forçar uma reorganização significativa das cadeias produtivas globais, criando oportunidades estruturais para o Brasil. Por outro lado, um acordo rápido entre as potências poderia diminuir essas oportunidades, mas também reduzir os riscos de instabilidade econômica global.

O monitoramento das relações diplomáticas e comerciais entre Brasil, China e EUA será fundamental. O Brasil conseguiu, até o momento, manter uma posição relativamente neutra, sendo taxado pelo “piso” de 10% pelos EUA, sem anunciar retaliações. Esta postura pode ser vantajosa, permitindo que o país aproveite oportunidades em ambos os mercados.

Para quem investe no Brasil, a recomendação é acompanhar com atenção os desdobramentos setoriais desta disputa, reconhecendo que os impactos serão assimétricos entre regiões e segmentos econômicos. A diversificação, combinada com a seleção cuidadosa de setores e empresas bem posicionadas para navegar este cenário complexo, poderá fazer a diferença nos resultados dos investimentos nos próximos meses.

Fontes e referências:

BBC. “Guerra de tarifas EUA x China: o que disputa comercial entre gigantes significa para o mundo”. Abril/2025.
Exame. “MT ganha e SP perde: o impacto bilionário da guerra comercial entre EUA e China para os estados”. Abril/2025.
O Globo. “Com guerra comercial de Trump, Brasil amplia venda de calçados para os EUA e de soja para a China”. Maio/2025.
CNN Brasil. “Secretário do Tesouro diz que EUA vão derrubar tarifas ‘desleais’ da China”. Maio/2025.
Valor Econômico. “China pode ser pressionada a acelerar estímulos econômicos, dizem analistas”. Janeiro/2025.
CNN Brasil. “Especialista: Guerra comercial pode fortalecer relação entre Brasil e China”. Abril/2025.
G1. “Tarifaço de Trump: secretário se diz ‘confiante’ para acordo com China”. Maio/2025.
Brasil de Fato. “Crise entre EUA e China revela instabilidade e abre espaço para Brasil se aproximar dos Brics”. Abril/2025.

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Luiz Eduardo Correa Pinto

Assessor de Investimentos Associado na BLUE3 | XP Investimentos, com mais de duas décadas de experiência em liderança comercial e especialização no setor financeiro. Expertise consolidada em soluções de investimentos, planejamento patrimonial e sucessório para pessoas físicas e jurídicas. Sólida trajetória na Indústria de Pagamentos, incluindo POS, API, câmbio e soluções SAAS. Experiência multicultural em negociações complexas e gestão de relacionamentos estratégicos.

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